Amigos leitores, inicialmente desejo uma abençoada semana para cada um de vocês e suas famílias!
Em tempos de luta contra o coronavirus não podemos descuidar do isolamento social, uso de máscaras e higienização das mãos, seja com sabão e água ou álcool em gel.
Mais ainda, não podemos confundir a necessária volta às atividades produtivas com a extinção da pandemia. Pois, na ânsia de voltar ao antigo “normal” muitos estão negando a doença através de atitudes irresponsáveis e impondo iminente risco às suas vidas e das demais pessoas.
Recentemente o Brasil ultrapassou a triste marca de 50.000 (cinquenta mil) vidas perdidas na guerra contra a Covid-19 e não há atitude negacionista que seja capaz de devolver a vida aos falecidos a fim de desfaze esta triste marca.
Hoje tratarei com vocês sobre um tema bastante recorrente no imaginário das pessoas e que na prática do dia-a-dia da política se dá de forma muito diferente do pensado. Discorreremos sobre a realidade dos profissionais da assessoria técnica/política em nosso país.
É muito comum que vejamos em conversas com amigos, familiares e colegas de trabalho manifestações no sentido de que os assessores políticos são parasitas, preguiçosos, incompetentes e ineficientes, cuja subsistência depende do favorecimento por parte do detentor de cargo eletivo com quem mantém relação pessoal. Será que sempre é assim?
Será que realmente os que desempenham atividades profissionais comissionadas nos Poderes Executivo e Legislativo realmente são fardos remunerados com recursos públicos?
Para começar a dirimir e compartilhar com vocês a presente reflexão (junto com algumas “provocações”) será preciso (em apertada síntese) compreender um pouco da regra geral pertinente ao funcionamento de um gabinete de parlamentar ou departamento vinculado a órgão do Executivo ou do Legislativo.
Nas Casas Legislativas, sejam municipais, estaduais ou federais, os detentores de mandatos eletivos possuem as mais diversas origens, poucos veem de uma área profissional afeta a administração pública.
Estatisticamente vemos que a maioria dos parlamentares é composta por: comerciantes, empresários e profissionais liberais das mais diversas áreas.
O exercício de um mandato parlamentar ou executivo exige para seu bom desempenho, uma larga visão de mundo e da comunidade que é representada.
Conhecimentos sobre: economia, contabilidade, sociologia, direito, filosofia, jornalismo, comunicação em redes sociais, sistema internos de gestão, administração pública e ética, dentre outros, são mais que necessários.
Ou seja, caro leitor, se existisse a hipótese de se restringir a condição de ser votado aos homens e mulheres que possuíssem tais competências, certamente sobraria vagas em nossas casas legislativas e no executivo em todo o país.
Vivemos na sociedade do imediatismo e ignorância, na qual o conhecimento é raso e cada vez mais oriundo de ferramentas de busca existentes na internet. Ou emanadas de “gurus” que se legitimam com base no número de “seguidores” que cabalam em suas redes sociais.
Todos são “doutores em tudo”, mas não possuem minimamente conhecimento em praticamente nada. As “fórmulas prontas” são repetidas sem que se saiba a origem das suas composições, disseminando assim o vírus do falso conhecimento ao redor do globo.
Poucos leem e constroem suas opiniões, como antes era impositivo pela falta das facilidades do mundo das internet – que é uma ferramenta fantástica de aprendizado quando quem as acessa possui um cabedal de conhecimento e discernimento para avaliar o que esses “oráculos modernos” têm a dizer.
E é neste cenário de “conhecimento raso” que nossos representantes são eleitos e posteriormente vem a exercer a representação popular oriunda do mandato eletivo. Cada vez mais que ingressa na vida pública carece de largura intelectiva para poder se doar aos seus representados.
Então, passa a ser mais importante para a sociedade e para os próprios detentores de mandatos eletivos, que sejam dotados de assessorias políticas e técnicas compostas por uma diversidade de profissionais capazes de embasar suas atuações, seja no parlamento ou no executivo.
Nossa análise agora começa a avaliar mais afundo a realidade dos cenários existentes nos parlamentos municipais, principalmente. Por uma imposição constitucional todos os municípios brasileiros são obrigados a possuir uma Câmara Legislativa Municipal.
Porém, a maioria esmagadora delas não possui condições de arcar com um quadro próprio de servidores que permeiem as mais diversas áreas do conhecimento, acima expostas.
E, mais ainda, milhares de Câmaras Legislativas Municipais sequer são dotadas de receitas para que gabinetes sejam formados e servidores comissionados sejam contratados, ficando o Vereador em questão desassistido de qualquer assessoria técnica e política.
Assim, a prestação das obrigações fiscalizatórias e legislativas fica deveras comprometida em sua qualidade. Já nas Câmaras Municipais das cidades mais abastadas a realidade é menos sofrida vez que conseguem possuir um resumido quadro de servidores efetivos, que auxiliam as suas Mesas Diretoras na gestão interna, mas não estendem os mesmos serviços aos Vereadores no exercício individual de seus mandatos.
Nas Casas Legislativas em que é possível a contratação por parte dos parlamentares de assessores políticos e técnicos para seus gabinetes, a realidade começa a ser diferente. Em cidades maiores é comum esta possibilidade, cabendo ao parlamentar escolher os nomes que comporão as suas equipes, sendo unicamente a sua vontade o critério para tais contratações.
Assim sendo, homens e mulheres das mais diversas áreas passam a ocupar os famosos “cargos comissionados”, repletos de polêmicas e fantasias.
Os profissionais que se prestam a trabalhar nessa área de assessoria técnica e política, em grande maioria, recebem salários um pouco maior que um salário mínimo e meio; não possuem enquadramento nas regras do direito do trabalho (CLT).
Consequentemente são desvalidos dos mesmos direitos de qualquer trabalhador brasileiro, notadamente: controle de jornada; aviso prévio, horas extras e Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço (F.G.T.S).
Seu vínculo de trabalho é precário, porém enquadrado como estatutário e usualmente trabalham sem limites de horas. Durante a semana e nos finais de semana, sempre que há necessidade manifestada por seus chefes, trabalham sábados e domingos sem qualquer compensação correspondente, sejam horas extras ou compensação em banco de horas.
Sem falar nos períodos pré-eleitorais e eleitorais propriamente ditos, como o que vivenciamos agora, quando passam a trabalhar de domingo a domingo, num ritmo que facilmente seria enquadrado como assemelhado ao trabalho escravo em qualquer empresa privada, com duras consequências para os empresários em questão.
Somadas a essas condições degradantes, ora citadas, associam-se ainda horrores que lhes são impostos quando trabalham para aquela pequena parcela de parlamentares e políticos que usam das “benesses do poder” para enriquecer a si e as suas famílias.
Casos nos quais passam a servir não apenas aos trabalhos relativos aos interesses do chefe, mas também a servir aos caprichos de familiares, atendendo aos mais ignóbeis tipos de caprichos e exigências, assemelhando-se cada vez mais a relação escravocrata acima mencionada.
Dentre os assessores políticos mais sacrificados estão os que tratam do transporte e logística, coagidos a realizar serviços afetos ao mandato do chefe juntamente com os domésticos de seus familiares. Trabalham de domingo a domingo, no limite da exaustão, que compromete as suas vidas e de quem transporta.
Recentemente, por conta de uma tragédia acontecida com uma criança em Pernambuco, flagrou-se situação que em tese pode ser recorrente em várias cidades brasileiras, nas quais o detentor de mandato eletivo usa recursos públicos para remunerar servidores que laboram em afazeres domésticos nas suas residências e não no órgão que lhes paga.
Ressalto que principalmente em nosso Estado não encontramos relatos de situações tão absurdas como as ora narradas. Possuímos, em maioria expressiva, homens e mulheres que honram seus eleitores e mandatos, restando a poucos as atitudes marginais que são coibidas pelos poderes constituídos de forma dura e implacável.
Na semana passada o noticiário nacional voltou a repercutir um ruidoso caso de “rachadinhas” (situação em que o assessor devolve parte do salário ao seu chefe) envolvendo um então Deputado Estadual do Rio de Janeiro.
Os áudios gravados pela polícia, nos quais o investigado foi flagrado, nos causa revolta e a falsa sensação de que todos os assessores políticos do Brasil são parte em ações marginais objetivando sangrar os cofres públicos. Induzem também a crermos que os salários são estratosféricos e que “mordomias” fazem parte do dia-a-dia desta categoria de trabalhadores.
Quando na verdade são em sua maioria trabalhadores que são equiparados a condições análogas a de escravos, com cargas horárias de labor desumanas e que sofrem silenciosamente por não ter a quem recorrer pelo simples fato de terem como seus algozes seus próprios chefes.
Sendo a necessidade de prover o sustento de seus familiares a razão por se submeterem a todo tipo de tratamento degradante e permanecerem trabalhando em um “ramo” no qual são absolutamente invisíveis.
Apenas lembrados quando algum “colega vilão” ocupa as manchetes dos noticiários nacionais por ter sido desvendada a sua participação em escândalo de malversação de recursos públicos, que salvariam milhares de brasileiros usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) – principalmente em tempos tão duros no qual o coronavírus ceifa diariamente centenas de vidas em nosso país.
Pedro Lacerda é advogado e escreve às segundas-feiras a coluna Parlamento em Foco, no Observatório de Olinda