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PARLAMENTO EM FOCO: A POLÊMICA COTA FINANCEIRA PARA NEGROS NAS ELEIÇÕES DE 2020 – Pedro Lacerda

Na semana passada o mundo jurídico e político foi surpreendido com uma decisão polêmica do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou a incidência de cota financeira para candidatos negros nas eleições que ocorrerão em 15 de novembro.

Tal espécie se deu pelo fato de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia apreciado a matéria e decidido que a nova cota racial/financeira apenas seria aplicada na eleição de 2022. O fundamento jurídico central que embasou a decisão da corte eleitoral foi à observância do “Princípio da Anualidade Eleitoral”.

Esse princípio está expresso no art. 16 da Constituição Federal de 1988 e preconiza que a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data da sua vigência. Tal comando legal tem por base garantir o sagrado conceito de “Segurança Jurídica”, aliado ao conceito da “Eficácia Normativa” – que é a capacidade das normas constitucionais produzirem seus efeitos.

Importante para a compreensão mais ampla do nosso artigo, não voltado para a Academia, mas sim para que seja palatável a todos os amigos que a ele tiverem acesso, trazer a baila uma definição jurídica de lei. Lei é espécie de ato normativo, com alcance geral, que prescreve regra elaborada pelo Poder Legislativo – e promulgada pelo Chefe do Poder Executivo.

A lei regulamenta os diversos aspectos jurídicos da vida em sociedade e tem por finalidades principais: criar, modificar ou extinguir regras jurídicas (e consequentemente) direitos e deveres. Uma vez que o Estado disciplina a vida em sociedade, é necessário que a população conheça de forma clara seus direitos e obrigações.

Sendo as leis os mecanismos utilizados para que todos (pelo menos em tese) saibam quais são seus limites enquanto cidadãos (o célebre ditado popular “que o meu direito começa quando o do outro termina”) e quais os limites do Estado, enquanto ente gestor da vida em sociedade, no sentido de interferir em diversos aspectos da vida das pessoas.

Importante ressaltar que quando o texto constitucional utiliza a locução “lei que alterar o processo eleitoral” devemos compreender o sentido amplo de “lei”, ou seja, qualquer norma capaz de inovar o ordenamento jurídico.

E uma vez que a sentença judicial consiste no pronunciamento do Estado-Juiz sobre uma controvérsia submetida ao seu julgamento, compreende-se que a sentença judicial transitada em julgado (quando não cabe mais recursos) constitui “lei entre as partes”, também devendo no âmbito do Direito Eleitoral respeito ao princípio constitucional, ora comentado.

De forma bem direta, trocando em miúdos, o cidadão tem que ter conhecimento das “regras do jogo democrático” ao qual sua vida em sociedade é ligada.

Sejam regras oriundas do Direito Penal, que tutelam os bens mais preciosos das pessoas, como a vida e a liberdade; ou regras pertinentes ao Direito Eleitoral (que disciplinam as escolhas dos nossos representantes), todas elas tem que ser estabelecidas de maneira clara e de forma que não funcionem como instrumento de opressão e injustiça.

Assim, nossa Constituição Federal adotou o “Princípio da Anualidade Eleitoral” como sendo uma espécie de “escudo da democracia”, que determina que as regras de uma eleição estejam fixadas com pelo menos um ano de antecedência da realização do pleito. O legislador constituinte assim agiu visando a preservação da estabilidade democrática e coibir casuísmos e surpresas nocivos a livre escolha dos representantes da sociedade.

Por não ser nosso artigo uma resenha jurídica, deixarei de aprofundar os aspectos técnicos-jurídicos desta polêmica decisão da nossa Corte Constitucional. Apenas, de forma direta e sucinta, expus a você, amigo leitor, o cerne constitucional que evidencia o desacerto de tal inovação a pouco mais de um mês do dia das eleições nos 5.570 municípios brasileiros.

O importante é que a sociedade brasileira tome conhecimento, de forma acessível e mais objetiva possível, de que em nome de uma “reparação histórica” – cuja pertinência também não é objeto do presente texto – a instância constitucional nacional deixa de observar um dos mais importantes fundamentos do processo eleitoral, qual seja o respeito ao supracitado artigo 16 da “Constituição Cidadã” de 1988.

Escrevo esse texto no dia 11 de outubro de 2020, dia que é celebrado o 24º aniversário do poeta, cantor e líder da imortal banda “Legião Urbana”, Renato Russo. Ele escreveu (dentre vários sucessos) a música “Que País é esse”, no distante ano de 1987, há 33 anos.

A referida canção possui um trecho que assim diz:

“Nas favelas, no Senado, sujeira pra todo lado.

Ninguém respeita a Constituição.

Mas todos acreditam no futuro da nação.

Que país é esse?

Que país é esse?

Que país é esse?

Saudades da poesia, inteligência, arte e música de Renato Manfredini Júnior, nome de batismo de Renato Russo, cuja mãe é pernambucana.

Se fosse vivo e tivesse oportunidade, talvez perguntasse aos Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF):

Que país é esse?

Pedro Lacerda é advogado e escreve às segundas-feiras para o Observatório de Olinda.

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